José Carlos Britto de Lacerda alerta contra o aprisionamento de pássaros em gaiolas

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Em minha caminhada matinal pela pracinha, deleito-me ao som do gorjeio de várias aves: Corrupião (Sofrer); Estevão; Curió; Bicudo; Canário da Terra; Sabiá; verdadeira sinfonia.

Olho em volta as árvores da praça em busca da visão dos coloridos das plumagens de tão variadas espécies, originárias de tantas paragens e na da meus olhos detectam, encontram. Indo mais à frente, concluo que tudo vem da varanda, no primeiro andar, da casa de “seu” Francisco. Diversas gaiolas enfileiradas, dependuradas, presas à laje por ganchos e suportes, retém diversas aves, subtraídas de seus “hatitats” naturais, aprisionadas.

“Seu” Francisco, próspero comerciante, dono de diversas fazendas de cacau e de gado, além de muitos imóveis urbanos, nem mesmo tem tempo de parar para ouvir os cantos. Seu filho Agenor, rapaz ativo, rebelde, arrogante como o pai, encontra-se preso, condenado por ter se envolvido em ativid\ades criminosas, em tráfico de entorpecentes, e roubo à mão armada e por ter estuprado e assassinado u’a jovem de apenas dezesseis anos. São muitos anos de pena por crimes cuja prática está comprovada e provada. Mas “seu” Francisco, esposa e filhos não admitem, discordam das penas aplicadas, lutam e recorrem, procurando por todos os meios legais, gastando fortunas, obter a liberdade de Agenor. A soma das penas supera os cem anos que eles, diretamente e através de seus advogados, questionam como exagerada, alegando que aquele total acabará por transformando a prisão em “perpétua”, porque certamente Agenor não voltará a gozar de liberdade e “morrerá na cadeia”. Nos arrazoados, fundamentam, os causídicos, suas teses, com a transcrição do texto da alínea “a” do inciso XLVII do artigo 5º da Constituição Federal (“não haverá penas: de caráter perpétuo”).

Entretanto, esquecem-se de que nenhum entre os passarinhos, presos em suas gaiolas, cometeu um único crime, não respondeu a inquérito policial nem a ação penal, não foi julgado nem condenado por qualquer Juiz ou Tribunal. E não tem quem o defenda, quem interponha uma apelação, um recurso especial ou extraordinário em seu favor. Mas só poderá reconquistar a liberdade por um descuido de cuidador, ou por efeito de um acidente. Carpirá anos a fio na prisão e, certamente, morrerá nela. Prisão perpétua e, inegavelmente, pena de morte.

De que adianta a Lei 6.905, de 12 de fevereiro de 1998, quando Poder Público e sociedade parecem fazer questão de ignorá-la, de fazer “vista grossa” e de interpretá-la somente em favor de cães, cavalos e gatos? Ou de aplicarem-na apenas quando a punição de algum infrator atender a interesses ideológicos, partidários, políticos e/ou satisfizer o desejo de perseguição ou de vingança de alguém?

Está escrito, na Lei:

Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Art. 25. Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se os respectivos autos. 

Crime:   Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”.

Interessante que “seu” Francisco (ou qualquer outro) não possui qualquer espécie de privilégio e, segundo a mesma Constituição Federal preleciona no “caput” do artigo 5º, é igual a todas as outras pessoas em direitos e obrigações, em sujeição à Lei e aos interesses sociais (“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,”)

E diante desta aberração e de tantas outras contradições que se justifica a pergunta: 

Há sinceridade?

José Carlos Britto de Lacerda é advogado ipiauense 


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