Ipiaú: José Carlos Britto de Lacerda acrescenta e comenta artigo sobre a vida da famosa cortesã Lozinha

Li no domingo (03) a matéria postada no IPIAÚ ONLINE (relembre) que, ao que parece, se propunha a relatar a história da famosa “Tia Ló”.

Longo, prolixo e mal pontuado, o texto mais aparenta uma crítica negativa, do tipo “socialóide”, aos pioneiros da conquista, da implantação da  economia e das vidas política e social deste município e da região cacaueira.

Lá, falaram sobre Olavo Barreto “e Silva”, Filhinha e outros e não se preocuparam em pesquisar sobre “Marietão”, “Gasa”, “Solange”, “Capuchinha”, “Miro de Vavá ‘Bilheiteiro”, “Miro de Arlindo Matos”, “Teixeirinha” e tantos outros de quem me esqueci. Enfim gastaram, perderam espaço, palavras, tempo e verbos, para não chegar a lugar algum.

Esqueceram-se de mencionar a importância que as casas semelhantes às de “Tia Ló” (a primeira na rua Jequié, na parte apelidada de “Dez Quartos” e, a segunda, na rua Jaime Tanajura, para onde ela transferiu seu estabelecimento, depois da catástrofe das chuvas e enchentes de 1964).

Era costume, antes  da evolução cultural, familiar e social iniciada com a instalações de motéis serem, as “moças  desonradas”, isto é, desvirginadas solteiras, expulsas dos seios de suas famílias como pretensa medida de assepsia e prevenção, para exemplo para outras moças e para “impedir a contaminação” das outras filhas da família.

Ipiaú nos anos 60 / acervo IBGE

Expulsas de suas casas pelos pais (principalmente os masculinos) as “meninas”, na grande maioria menores, viam-se obrigadas a empregar-se como domésticas – mas pouquíssima conseguiam trabalho na mesma  cidade – e, por isto, aventuravam-se pelo mundo. Sofriam desprezo, discriminação, frio, fome e sede e não encontravam opção a aceitar assédios sexuais e eventuais “proteções” de muitos cafetões, rufiões e “machões”, como forma de sobrevivência.

Normalmente um desses encaminhava sua “nova  presa” para uma “casa de mulheres”, onde ela era recebida, hospedada, abrigada e alimentada e treinada para o “comércio do sexo”, a prostituição, porque teria que ganhar dinheiro para manter-se e para pagar aluguel de quarto, alimentação, roupas, remédios e produtos de higiene. Tais estabelecimentos continham, também, bar com salão de dança (por aqui apelidado de “Cabaré”), nos quais as  moças tinham que atuar todas  as  noites dançando com os “clientes” e estimulando-os a consumir bebidas e, muitas vezes por noite ausentando com eles do salão, para o exercício do principal ofício, nos aposentos nem sempre discretos.

“Tia Ló”, tanto quanto as demais “empresárias do sexo”, exercia papel social importante acolhendo, apoiando, recolhendo aquelas pobres vítimas da discriminação, do preconceito e da maldade sociais, ainda que auferindo lucros com aquela atividade. E, de vez em quando – e não muito raramente – um homem se apaixonava por uma daquelas moças, retirava-a daquele convívio, levava-a para conviver com ele e, mais tarde, até se casava com ela, dando-lhe uma família, um lar, um nome, respeito. Eu conheci diversos casos assim.

Mas havia uma outra particularidade no comportamento de “Tia Ló”, autêntica virtude: ele procurava preservar, proteger, os jovens inexperientes que aportavam em seu estabelecimento à procura de um início de experiência sexual. Ela os separava dos demais frequentadores, colocava-os normalmente em um cômodo à parte, com mesas e cadeiras e, mais, encaminhava para eles, para fazer-lhes companhia, “meninas” mais experientes e que – em razão de sua experiência – ela sabia não serem portadoras de “doenças da rua” (DST).

Assim ela agiu comigo e com todos os meus amigos e conhecidos, quando cada um começou a frequentar sua “casa de mulheres”.

De um lado, ela acolhia meninas rejeitadas; de outro, protegia jovens varões; de mais outro, não permitia “barracos”, brigas, escândalos nem divulgação externa dos fatos que ocorriam no seu estabelecimento.

Chegou, entretanto, a evolução, a modernidade, primeiramente surgiram os “castelos” (casas de “famílias” que alugavam quartos para aventuras sexuais) e, mais tarde, os motéis. Isto e o “aperfeiçoamento” dos costumes, aliado ao crescimento das facilidades de comunicação e deslocamento acabaram convertendo-se no “golpe de misericórdia” sobre aquelas atividades e forma comércio.

Creio que “Tia Ló” merece reverência.

Grande número de pessoas, em Ipiaú e na região, tem conhecimento  de eu ter sido funcionário do Banco do Brasil S. A., laborando por longos anos nesta cidade e, depois, por cerca de três anos, em Itabuna. Pois bem, agora forneço  a informação pedida pelo autor do artigo a que antes me referi, informação que, enfim, é o objetivo desta cansativa e longa explanação: o nome de ”Tia Ló”, fornecido por ela própria quando, uma vez, eu a atendi na emissão de uma ordem de pagamento, era “Maria Rosália de Jesus”. Que Deus a tenha no Seu Reino!

 

José Carlos Britto de Lacerda é advogado


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