Numa manhã da primeira semana de agosto, Bom Jesus da Lapa, no oeste da Bahia, vira uma metrópole dos pagadores de promessa. O protagonista é o morro de pedras, que reserva grutas transformadas em santuários para os romeiros que lotam o município. Há, no entanto, preocupações com essa gente toda.
No fim de maio, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) recebeu um relatório, produzido a partir de imagens, que mostrou “alto risco” de queda de pedras da formação rochosa transformada em atração religiosa.
O documento elaborado pelo Serviço Geológico do Brasil, do Ministério de Minas e Energia, levou o órgão estadual a pedir que a Prefeitura de Bom Jesus e a Diocese entreguem, até o dia 27 de agosto, um plano de contingência e evacuação em casos de acidentes ou desastres naturais
O risco de acidente, segundo o MP-BA, se agravou desde 2016, com o “aumento do número de residências no entorno das rochas e de pessoas”. “Foram apresentadas imagens, evidenciando pontos de deslocamento de rochas”, afirma o promotor José Franclin Andrade de Souza, do MP. Se o documento não for apresentado no prazo, há possibilidade de interdição da gruta.
A solicitação do plano foi feita pelo MP-BA no fim de julho, em uma audiência de urgência marcada com a Prefeitura e a Diocese. Diante do risco apresentado pelo documento do Serviço Geológico, o órgão solicitou medidas que reduzissem o risco de contratempos antes da maior das quatro romarias da cidade.
Entre 28 de julho e 6 de agosto, um milhão de pessoas lotam a cidade onde moram 65 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A tradição tem 333 anos e é reconhecida como Patrimônio Imaterial do Estado da Bahia.
“A gestão limitou-se a informar que nenhuma medida de segurança havia sido adotada e que analisaria qual sugestão do Serviço Geológico iria executar”, afirma Souza.
Entre as medidas solicitadas já para este ano, estavam a afixação de placas em locais estratégicos, “ressaltando à população que aquela região é considerada de alto risco”, capacidade máxima de três mil pessoas no interior da Gruta da Soledade – número que pode ser modificado até a definição do Corpo de Bombeiro – e o limite de 20 pessoas por vez na subida e descida Cruzeiro do Morro da Lapa, um dos points dos romeiros.
“Trata-se de trecho que merece especial atenção pois há risco do contato humano com pedras e rochas. Não havia controle por parte dos requeridos do quantitativo de pessoas”, afirma o promotor.
Em 2025, gestão municipal e Igreja devem implementar um sistema de controle em tempo real do número de pessoas no cruzeiro do Morro.
Novo estudo será realizado
Tudo em Bom Jesus da Lapa gira em torno da religiosidade – não só o nome. Lojinhas vendem souvenirs católicos e as paredes das pousadas têm imagens cristãs. A ida de romeiros à cidade aumentou ao longo dos anos com a captação do seu potencial turístico. Hoje, a romaria local é a terceira maior do Brasil.
A Prefeitura de Bom Jesus da Lapa reforçou, por meio de nota, que a gruta do Bom Jesus é administrada pela Diocese da cidade, mas que está à disposição do MP e tem se mobilizado para “assegurar a segurança. A gestão destacou que a análise feita pelo Serviço Biológico é “preliminar” e diz buscar apoio do Governo Federal para um novo estudo.
“Mais aprofundado, que envolva uma análise e coleta do material para estudo laboratorial junto a um estudo do interior e a base rochosa”.
Um novo estudo geológico, segundo a Prefeitura, também já foi encomendado à Secretaria municipal de Meio Ambiente, “com a finalidade de melhor monitorar as ações referentes às atividades turísticas e população vizinhas”.
Um dos pontos destacados pelo relatório é a necessidade de tirar as casas que estão encrostadas nas pedras. “Temos buscado recursos junto ao Governo do Estado para desapropriação desses imóveis e sua adequação para prevenir deslizamento”.
“As casas sempre estiveram lá, não houve crescimento na quantidade. Mas é claro que estão em torno do morro e podem correr risco”, questiona Padre Roque, que conhece o local há mais de 30 anos e está na terceira gestão do santuário.
O plano de contingência solicitado pelo MP, de acordo com o pároco, já começou a ser montado. Mas há perguntas em aberto.
Para discutir o assunto, o padre afirma que a Diocese e a Prefeitura querem se reunir com o Ministério de Minas e Energia, que não atendeu às solicitações da reportagem. A próxima festa religiosa que aconteceu em Bom Jesus da Lapa acontece no dia 15 de setembro, dedicada a Nossa Senhora da Soledade
Correio24Horas
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