Sem apresentar cálculos, o Ministério da Economia afirmou que a medida de zerar até o final de 2022 o imposto de importação sobre o etanol anidro pode baixar em até R$ 0,20 o preço do litro da gasolina. Especialistas, porém, dizem que a redução para o consumidor será praticamente nula.
O etanol anidro compõe 27% da mistura da gasolina, por isso seu custo afeta o preço do combustível.
Para o consultor Dietmar Schupp, especialista em tributação de combustíveis, a isenção que entrou em vigor nesta quarta-feira (23) vai baixar apenas R$ 0,004 por litro no preço médio nacional.
O imposto sobre o etanol anidro importado de fora do Mercosul era 18%. A alíquota era cobrada essencialmente do álcool vindo dos Estados Unidos, país que também tributa o etanol brasileiro.
A isenção foi anunciada na segunda-feira (21) pelo governo Jair Bolsonaro (PL) como mais uma medida para tentar conter a inflação em meio à disparada nos preços das matérias-primas internacionais após o início da guerra na Ucrânia.
Além do etanol, também foram beneficiadas commodities como café, óleo de soja e o açúcar.
BRASIL IMPORTA POUCO ÁLCOOL
Uma das razões para o impacto ser tão inexpressivo é que a quantidade de álcool importado pelo Brasil para compor a mistura da gasolina é relativamente pequena.
Dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) mostram que, em 2021, o Brasil produziu 11,4 milhões de m³ de etanol anidro e exportou 5,4% deste volume. A importação total foi de 432 mil m³, o equivalente a 3,8% do etanol anidro produzido no Brasil.
Segundo Dietmar Schupp, apenas 2% do etanol anidro vendido atualmente no Brasil é importado. A redução de R$ 0,20 por litro projetada pelo governo só ocorreria caso todo o etanol misturado à gasolina viesse de fora do país.
Mauricio Canêdo Pinheiro, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV (Fundação Getúlio Vargas), também projeta um efeito pequeno sobre o preço para o consumidor da isenção sobre o etanol anidro. Como Schupp, ele elenca a baixa participação do álcool importado no total utilizado pelo país, e o fato de o produto compor apenas 27% da mistura da gasolina.
“São fatores que diluem o efeito da medida”, afirma Pinheiro.
GOVERNO DIZ QUE PREÇO VAI CAIR E IMPORTAÇÃO VAI CRESCER
Já o Ministério da Economia afirma que a estimativa de R$ 0,20 foi baseada “em um modelo de equilíbrio parcial”, mas que “o estudo não está disponível para publicação”.
A equipe econômica alega que a isenção vai aumentar a participação do etanol importado no mercado nacional, com um choque de preços que chegará ao consumidor.
“Para 2022, a produção brasileira de etanol deverá somar 28,3 bilhões de litros na safra 2021/22, uma queda de 13,7% em relação à safra anterior. Já nos Estados Unidos, a expectativa é de aumento da safra”, diz o ministério.
Importadores de combustíveis, diretamente beneficiados pela isenção, corroboram a versão do governo.
“Apesar de o Brasil ser um grande produtor de etanol, nós temos algumas janelas de importação em razão da sazonalidade. Não é um volume expressivo por ano, mas não é desprezível”, diz Sérgio Araújo, presidente da Abicom (Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis).
PARA PRODUTORES DE ÁLCOOL, MEDIDA É INEFICAZ
A expectativa de choque nos preços a partir da isenção do imposto de importação, porém, é contestada por produtores nacionais.
“Hoje não há margem para entrada de etanol americano aqui, mesmo zerando imposto”, diz Alexandre Andrade Lima, presidente da Feplana (Federação dos Plantadores de Cana do Brasil).
“O preço do etanol americano está alto com essa crise mundial de combustíveis e hoje não tem mercado aqui. Pode ser que mais na frente venha a entrar etanol, mas no momento [a isenção de impostos] não vai ter muita influência.”
Renato Cunha, do Sindaçúcar-PE, o sindicato dos produtores de cana de Pernambuco, afirma que a isenção representa um benefício sem reciprocidade nos EUA e que pode custar muitos empregos no Brasil.
Rodrigo Zingales, diretor executivo da AbriLivre, associação que representa revendedores de combustíveis em todo o Brasil, afirma que isentar o etanol dos EUA vai beneficiar poucos agentes do mercado e que, dificilmente, o consumidor será beneficiado.
“O governo deveria estar investindo pesado em produção de açúcar e etanol, mas está fazendo o contrário, subsidiando produtos importados”, diz Zingales.
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