De início, até parece uma consulta médica comum. O paciente informa quais são seus sintomas, se faz algum medicamento de uso contínuo e solicita o seu documento para faltar ao trabalho. Mas todas as perguntas são respondidas online, e é o paciente que decide quantos dias quer de atestado. Depois, basta fazer um Pix de R$ 29 para receber o documento em PDF.
Uma investigação do site Correio da Bahia revela que a compra de atestados médicos falsos pela internet é rápida e simples. O crime, no entanto, pode estar com os contados.
Isso porque o Conselho Federal de Medicina (CFM) lança, nesta terça-feira (5), a plataforma Atesta CFM. O site vai reunir informações sobre todos os atestados médicos emitidos no Brasil. Os dados poderão ser checados por pacientes, profissionais e empresas. O objetivo é combater fraudes e irregularidades na emissão dos documentos. A partir de 6 de março de 2025, só serão permitidos atestados feitos através da plataforma.
Fraudar documentos assinados por falsos médicos deve ficar mais difícil a partir do lançamento da plataforma. Hoje, obter um atestado pela internet varia entre R$ 29 e R$ 160, segundo uma pesquisa feita pela reportagem. O valor depende da quantidade de dias de afastamento e do site utilizado para a compra. Ao menos 15 sites prometem enviar o documento em até 30 minutos para os compradores.
O CORREIO fez o teste. Em um desses sites, o interessado é direcionado para uma conversa no WhatsApp. Uma mensagem automática pergunta qual o tipo de documento o cliente deseja. Além de atestados, são vendidos laudos e receitas médicas, atestados para prática de esportes, exame de gravidez e até atestado de sanidade mental.
Se o atestado falso for para um dia de trabalho, o custo é de R$40. O valor máximo cobrado pelos falsificadores é R$160 para 15 dias de folga. A promessa é que os atestados sejam emitidos com assinatura de médicos que trabalham no exterior, carimbo oficial e QR Code para verificação. Isso é possível porque os criminosos fraudam as assinaturas de profissionais verdadeiros, como explica Otávio Marambaia, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb).
“São tantos casos porque é relativamente fácil imprimir um bloco e fazer carimbos colocando nomes até de médicos que existem, mas falsificados. Nesses casos, nomes e registros de médicos são utilizados indevidamente”, diz Otávio Marambaia, presidente do Cremeb
Apenas neste ano, o Cremeb recebeu 1.505 solicitações de veracidade de atestados. Dessas, 203 foram identificados como falsos – o que representa 13% do total. As consultas podem ser solicitadas por qualquer pessoa através do site do conselho. As empresas respondem pela maioria dos pedidos. Fornecer atestado médico é crime e, para os funcionários, pode causar demissão por justa causa.
Atestados falsos a partir de R$29
Em outro site consultado pela reportagem, os atestados custam R$29 independente da quantidade de dias de afastamento. São feitas diversas perguntas ao interessado, inclusive, qual o código da Classificação Internacional de Doenças (CID) desejado e se há algum fator de risco, como comorbidades. Os sites oferecem ainda o envio do atestado online ou físico.
O presidente do Cremeb explica quais podem ser os riscos da disseminação dos documentos falsificados. “Altera o perfil de risco de doenças em empresas, além de causar prejuízo financeiro, aumentando o absenteísmo. É também uma coisa ruim para a saúde pública porque é importante que os dados sejam verdadeiros, no sentido de que políticas públicas possam corrigir ou orientar as ações de saúde”, diz Otávio Marambaia.
A adulteração de atestado médico configura crime de falsidade ideológica e falsificação de documento, com pena de até seis anos de reclusão. Tanto o médico que fornece atestado como o indivíduo que utiliza o serviços descumprem a lei. A Polícia Civil da Bahia foi questionada sobre a prática, mas informou que não possui dados sobre denúncias de atestados falsos. O Ministério Público da Bahia não se manifestou sobre o assunto.
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