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Domingo de Carnaval…nesta noite da expressão máxima da nossa identidade cultural, o cinema brasileiro pode fazer história. “Ainda estou aqui”, filme dirigido por Walter Sales, concorre em três categorias da maior premiação do cinema mundial, o Oscar: Melhor Filme Internacional, Melhor Filme e Melhor Atriz pela atuação de Fernanda Torres.
Assisti ao filme em Salvador, numa sala de cinema. Ir a uma sala de cinema ainda é um experiencia indescritível, onde compartilhamos com pessoas que sequer conhecemos múltiplas sensações e percepções geradas pela junção da imagem e do som que é muito mais intensa e vibrante do que as telas de tv e celular. É a primordial “arte cinematográfica”.
Plateia com bom público, haviam inclusive ipiauenses na plateia. Dava para ouvir e sentir a emoção do público. Gente enxugando lágrimas. Outros “fungando” para engolir o “choro”. Grito de “ditadura nunca mais!”, e aplausos…muitos e calorosos aplausos em dois momentos do filme: na primeira passagem de tempo, onde a família Paiva deixa o Rio Janeiro após o “desaparecimento” de Rubens Paiva; e ao final do filme, aí já com imagem final da família Paiva, com Fernanda Montenegro como a Eunice Paiva envelhecida. Nunca vi isso numa sala de cinema!
O início do filme narra a vida de uma família comum. Uma família carioca, uma família brasileira, que faz seus planos, constrói seus desejos e sonhos. Mas, a ânsia pelas cenas da ação dos militares contra o ex-deputado Rubens Paiva, que é o ápice dramático do filme, pode fazer, e foi assim comigo, se questionar o “porquê” do relato, talvez prolongado, do trivial cotidiano da família Paiva. Há um sentido nisso! Esse é um filme sobre uma família. Uma família destroçada pela perseguição política feita por agentes públicos a “caça de comunistas”.
A memória é outro ponto fundamental de “Ainda estou aqui”. O sucesso do filme acontece no mesmo momento em que alguns ensejam, desejam e até “trabalham-se” pelo rompimento democrático e o retorno dos militares ao poder do Estado. “Ainda estou aqui” é a exposição de um passado que a “memória” de muitos brasileiros querem “intencionalmente” esconder” de si e dos outros. Eunice Paiva que dedicou parte de sua vida à memória dos “desaparecidos” da ditadura militar brasileira, travou uma intensa luta contra o alzheimer e suas consequências, como a perda progressiva da memória e o sucesso do filme é uma justa homenagem àquela que mesmo enfrentando um drama tão desafiador, criou seus filhos e empenhou-se na defesa das causas indígenas como advogada e deputada federal.
Independente dos prêmios já ganhos ou que possa vir a ganhar, “Ainda estou aqui” já fez história: por colocar um filme brasileiro como concorrente ao Oscar de Melhor Filme; pelo sucesso de bilheteria, inclusive fora do pais; por rememorar em um momento tão conturbado da história brasileira e mundial como o que vivemos agora, as agruras de uma ditadura; pela justa homenagem a esta incrível mulher chamada Eunice Paiva; por demonstrar que o cinema e a arte sobreviveram a um período tão sombrio que a cultura brasileira passou recentemente.
Nessa noite carnavelesca, onde o espírito momesco da alegria e da vida plena, que venha o Oscar!
Marcelo da Silva A. Santos
Leitor Ipiaú Online
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