Na noite da última segunda-feira, 8 de julho, o mundo das artes perdeu um dos seus mais importantes protagonista.
Antonio Luiz Silva Martins, mais conhecido como Lula Martins, o homem que deixou sua marca no globo que se observa na torre do templo da PIB de Rio Novo e em tantas outras obras mundo a fora, também foi genial no cinema, tanto como o ator do emblemático filme Meteorango Kid-o herói intergaláctico-, quanto no documentário RIPA que ele filmou aqui nesta região da Bahia.
A historia dessa obra cinematográfica consta do livro “PERSONAGENS DE IPIAÚ” que o jornalista José Américo Castro estará lançando brevemente em Salvador e em Ipiaú.
Confira o texto de Zé Américo e a façanha de Lula Martins.
A FORÇA DESCOMUNAL E A ARTE MÍSTICA DE RIPA
A contracultura avançava com suas efervescentes ramificações, quando deram por conta da figura exótica de Ripa, um negro octogenário, truculento e fisicamente saudável, que diziam ser louco.
Ele percorria os municípios da região e, quando bebia umas pingas, aprontava cenas que atemorizavam as pessoas das cidades onde passava.
Muitas vezes enfrentou a polícia e, para detê-lo, era preciso uma guarnição inteira.
Nos comentários sobre os personagens da rua, sua figura é sempre evocada. Despertou tanta atenção, que se tornou tema de um documentário produzido pelo cineasta Lula Martins e exibido em uma concorrida jornada de curta metragem na capital baiana.
Foi com base nos relatos de Lula Martins, artista multimídia da geração tropicalista, que elaboramos este texto.
Lula aproximou-se de Ripa, descobriu seu verdadeiro nome, registrou seus hábitos, sua arte mística, esculpida nos barrancos da rodovia Ipiaú-Jequié, e a semelhança desses desenhos com as inscrições em cavernas de povos antigos da África Ocidental.
Ouviu muitos casos a respeito de Ripa, alguns pouco verossímeis, por parecerem lendas em seu aspecto dramático.
Antes de escolher a vida errante e mística, Ripa era tropeiro e, segundo contam, trabalhava para um poderoso coronel do cacau, até que flagrou uma relação sexual entre a digna esposa do rico fazendeiro com um vaqueiro.
Denunciou o adultério para o patrão e, como prêmio pelo zelo com a honra do coronel, teve a cabeça envolvida em panos, embebidos por querosene e queimada.
“Dificilmente se poderia provar essa terrível história”, comenta Lula.
A origem do apelido Ripa, o cineasta apurou que provém do forte grito que ele dava ao saltar com uma vara sobre os casebres, “demonstrando incomum destreza”.
O verdadeiro nome de Ripa era Teotônio Bispo dos Santos.
Já o misticismo, provém das abstratas figuras pictóricas que esculpia nos barrancos e pedras que margeavam o antigo traçado da rodovia Ipiaú-Jequié.
Seu instrumento nessa arte era um pedaço de facão.
Ripa dormia em cavernas e, nas noites de lua cheia, cantava tiranas junto à uma fogueira.
“Quando pedi a Ripa que me contasse a sua vida e o que o levou a fazer aqueles painéis por mais de vinte anos, ele respondeu que um dia, enquanto pegava uns animais em um mangueiro, apareceu um anjo com uma espada de fogo e lhe mostrou o trono da rainha e ordenou que marcasse as palavras de Deus”.
Ripa também contou ao cineasta, que foi internado no hospício Juliano Moreira, em Salvador, onde sofreu choques na cabeça e maus tratos.
Vingava-se quebrando as torneiras e camas.
Um dia conseguiu fugir e fez, a pé, os 400 Km que separam Salvador de Jequié.
Voltou à sua toca, encravada sobre uma grande pedra no barranco da estrada de acesso a Ipiaú e continuou a sua extensa e inacabável obra.
Lula conta que foi um pouco difícil a sua aproximação com Ripa que a princípio se mostrou arredio e invocado com a pequena equipe de filmagem.
Em um dos primeiros contatos o tempo estava chuvoso e frio.
O cineasta tentou presentear o personagem com uma capa de chuva e algumas roupas, que foram recusadas de imediato com as seguintes palavras: – “O mundo me protege”.
Do cartaz do documentário de Lula Martins, colhemos a foto de Ripa.
A trilha sonora desse documentário que foi exibido no ICBA, em Salvador, durante uma das primeiras edições da Jornada de Curta Metragem da Bahia (produzida por Guido Araújo) é da autoria do percussionista Djalma Correia.
O músico também acompanhou Lula Martins nas filmagens, juntamente com Zé Carlos Jaraguá e o fotógrafo Valter Queiroz, cujo estúdio fotográfico localizava-se na Rua Floriano Peixoto, em Ipiaú.
Foram meses para finalizar as filmagens.
Ripa, por vezes, desaparecia durante semanas e não aceitava ser filmado enquanto trabalhava em seus painéis. Uma cópia do documentário está no Museu do Inconsciente da Casa das Palmeiras, em São Paulo.
Lendo uma revista da “Internacional Geográfica”, Lula se deparou com uma reportagem sobre bosquímanos do deserto do Kalahari, o povo mais antigo da África Austral, que também moravam em cavernas.
As ilustrações da matéria mostravam inscrições bem parecidas com os desenhos de Ripa.
Traços fisionômicos de um desses bosquímanos (de touca), revelados em foto veiculada na Internet, também mostra grande semelhança com o homem de vida errante e mística que viveu na região de Ipiaú.
As fotos em preto e branco foram extraídas do livro Mágicas Mentiras, de Lula Martins.
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