
“Já fui assediada no caminho de minha casa por um cara num prédio. Ele gritou de lá. Esse foi um caso que me marcou muito, porque é perto de casa. Por um caminho que sempre costumo andar”, conta a estudante de psicologia, Heloisa Mabile, de 22 anos. Essa é a realidade das vítimas de assédio sexual em suas diferentes formas, para 7 em cada 10 mulheres de Salvador, de acordo com a pesquisa ‘Viver na Cidade: Mulheres’, realizada pelo Instituto Cidades Sustentáveis em parceria com o instituto de Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec).
O estudo aponta que 74% das mulheres que moram nas 10 maiores capitais brasileiras já passaram por algum tipo de assédio sexual – desde uma questão física a uma fala, incluindo Salvador. Entre as cidades pesquisadas, Porto Alegre lidera o ranking com 79%, seguida por, Recife (77%), Rio de Janeiro (77%), Goiânia (76%), São Paulo (74%), Salvador (73%), Manaus (72%), Belém (70%), Fortaleza (68%) e Belo Horizonte (68%).
Somente na Praça da Piedade, na capital baiana, cinco das cinco mulheres questionadas ontem pela Reportagem de A TARDE informaram ter sido vítimas de assédio.
De acordo com a pesquisa, os cenários mais comuns das ocorrências de assédio em Salvador foram ruas e espaços públicos, como praças e parques, para 57% das mulheres entrevistadas. Ambientes que para Heloísa geram insegurança. “Já ouvi coisa de homem na rua, já pararam pra buzinar. No meio da rua, nos sentimos muito inseguras, porque não sabemos quem está passando do nosso lado. São situações muito revoltantes, porque toca num ponto muito sensível, que é a segurança, a vulnerabilidade. Parece que fica evidente o quão vulnerável estamos na sociedade”, afirma a estudante.
Do total das entrevistadas nos 10 estados, 56% disseram que sofreram assédio em ruas e espaços públicos. O sociólogo e coordenador de relações institucionais do instituto cidades sustentáveis, Igor Pantoja, explica as causas para o maior número de ocorrências nesses lugares. “O espaço público é mais próximo da questão do anonimato, é mais fácil a pessoa passar despercebida talvez num espaço público do que às vezes num espaço fechado como uma empresa ou escola. E por ser espaço aberto é mais difícil de você ter ali imediatamente onde fazer uma denúncia, alguém pra chamar”.
Insegurança
Outros cenários comuns de assédio apontados pelas mulheres entrevistadas foram: dentro do transporte público (com 51 menções), no ambiente de trabalho (39), no ambiente familiar (30), em bares e casas noturnas (24), e em transportes particulares, como carros de aplicativo, táxi e mototáxi (17). Essa realidade já fez com que a acadêmica Renata da Silva, 40, tome medidas para evitar tais situações.
“Só saio acompanhada de um amigo e evito determinados lugares porque sei que isso vai acontecer. Chegava em um bar e os caras vinham pra cima como se você estivesse oferecendo alguma coisa. Quando a gente chega em um ambiente desse pra eles parece que estamos nos colocando como objeto. É uma situação ultrajante, sensação de insegurança imensa, você se sente muito vulnerável”, relata.
Estrutura
O fator patriarcal de nossa sociedade é apontado como uma das causas desse comportamento dos assediadores, conforme o psicólogo e docente da universidade Wyden, Fabrício Paixão. “O que leva esse sujeito a se sentir de fato confortável diante de um assédio é aquilo que nós chamamos de uma estrutura patriarcal, no sentido de que o homem considera essa mulher ainda como objeto”.
O estudo também questionou a população entrevistada sobre quais ações deveriam ser adotadas para enfrentar a questão. Aumento das penas de quem comete violência contra a mulher recebeu a maior pontuação, no total das 10 capitais, com 54%. Ampliar os serviços de proteção a mulheres em situação de violência a em todas as regiões da cidade (49%) e agilizar o andamento da investigação das denúncias (40%), foram as outras opções mais citadas. A posição das respostas é a mesma quando considerado apenas Salvador.
Prevenção e combate
Para prevenir e combater os casos de assédio e violência contra as mulheres em Salvador, a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Infância e Juventude (SPMJ) adota medidas, como: a Patrulha Guardiã Maria da Penha, o Núcleo de Enfrentamento e Prevenção ao Feminicídio (NEF), Decreto do Alerta Salvador e Observatório da Mulher; entre outras iniciativas.
Entre os canais de denúncia para as mulheres estão o Centro de Atendimento à Mulher Soteropolitana Irmã Dulce (CAMSID), contato por meio do telefone 71 3202-7399; Centro de Referência Especializado de Atendimento à Mulher Arlette Magalhães (CREAM) cujo telefone é 71 3202-7380; Centro de Referência de Atendimento à Mulher Loreta Valadares (CRAMLV) por meio do número (71) 3202-7396; e a Casa da Mulher Brasileira (CMB), que pode ser contactada por (71) 3202-7390. Para vítimas de importunação sexual há também o Ligue 180, que é a Central de Atendimento à Mulher.
Sobre a pesquisa
Para a Pesquisa Mulheres 2025, do Instituto Cidades Sustentáveis, em parceria com o Ipec, foram realizadas 3.500 entrevistas nas 10 capitais já citadas, com controle de cotas variáveis por sexo, idade, classe social e ocupação.
Fonte: Ag. A TARDE
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